No ultimo artigo falei resumidamente sobre como a taxa de juros influencia o valor dos ativos. Desta vez, vou explicar melhor sua relação com o preço dos imóveis, que segue a mesma lógica.
Vamos começar já com um exemplo, que acho que esclarece um pouco as coisas.
Veja na tabela acima o impacto que tem uma taxa de juros menor e um prazo de financiamento maior para o consumidor. Um cara que tenha R$ 2 mil/mês disponíveis para pagar seu financiamento, consegue comprar apenas um imóvel de R$189 mil com juros de 12% a.a. e prazo de 20 anos.
Com uma taxa de 8,5% a.a. e um prazo de 35 anos, com a mesma renda disponível, o cara conseguiria comprar um imóvel 46% mais caro, de R$276 mil.
Isto foi o que aconteceu no Brasil nos últimos anos. Com estímulos do Governo, houve redução de taxas de juros e aumento de prazos para financiamento. Com a possibilidade de financiar mais por mais tempo, as pessoas aceitaram pagar mais caro por um imóvel gerando valorização.
Além disso, não apenas os juros caíram e o prazo aumentou, mas o crédito também passou a ser ofertado mais intensivamente. Isto porque as instituições financeiras passaram a olhar o financiamento imobiliário com outros olhos.
A valorização dos imóveis no período 2007-2010 também teve o efeito do aumento da renda do trabalhador. Se considerarmos o aumento de renda nominal de 10% a. a. (real + inflação) do brasileiro nesses 3 anos, teríamos o seguinte quadro:
Ou seja, ajustando a renda disponível para inflação e ganho real no período, o valor do imóvel poderia praticamente dobrar. É claro que tudo isto é apenas uma estimativa ilustrativa para elucidar como estes fatores afetam o valor dos imóveis. Mas a lógica ajuda a entender o que ocorreu no Brasil nos últimos anos.
A SELIC e o valor dos imóveis
A Selic é a taxa básica de juros da economia e serve como um parâmetro para remuneração de títulos públicos e para o CDI, em que muitas aplicações são atreladas. Ela pode afetar o valor dos imóveis de várias formas:
Custo de Oportunidade para o consumidor: Quando a SELIC cai, o retorno do capital também cai. Um investidor comum passa a ganhar menos em suas aplicações (inclusive na Poupança). Por isso, passa a ser mais vantagem investir em imóveis, que rendem aluguel.
Por exemplo, se uma LFT te rende 1% a.m e um imóvel te rende de aluguel 0,5% a.m., é menos atrativo investir em imóveis. Mas se a LFT passa a render 0,3% a.m, investir num imóvel que rende 0,5% a.m passa a ser mais vantajoso que antes¹. Na realidade, é possível até que você esteja disposto a pagar um pouco mais caro pelo imóvel e ter um rendimento de 0,35% a.m., ainda acima do valor da LFT. Com isso, o valor do imóvel tende a subir quando a taxa SELIC cai.
A tabela acima mostra outra simulação. Se um investidor comum aceitasse receber de aluguel o mesmo retorno mensal da Selic, veríamos que o fato da Selic cair de 12% ao ano para 7,25% a.a. poderia causar um aumento de 62% no valor imóvel, considerando o valor do aluguel estável².
Sabendo que em geral o valor do aluguel sobe anualmente, acompanhando o reajuste do IGP-M. Teríamos para um IGP-M de 5% a.a. ao longo de 3 anos:
Ou seja, com o reajuste do aluguel pelo IGP-M por 3 anos e a queda da SELIC, a pressão sobre o preço do imóvel poderia ser de 88%.
Custo de Oportunidade para a instituição financeira: os bancos também emprestam e pegam dinheiro emprestado todos os dias. O preço que pagam ou recebem são influenciados pelas taxas SELIC e DI. Quando a SELIC sobe, vale menos a pena para o banco pegar emprestado e vale mais a pena emprestar a outros bancos e ao Governo Brasileiro, certo? (moleza, a uma taxa de juros mais alta você preferiria emprestar ou pegar dinheiro emprestado?)
Logo, a juros mais altos os bancos estão menos dispostos a correr riscos, já que se alguém não pagar ele vai ter que recorrer a juros altos. Então, quanto maior a Selic, menos a fim de emprestar para você o banco vai estar (e apenas a juros mais altos). Simples assim. A Selic alta diminui a oferta de crédito por parte dos bancos.
Outros fatores que influenciam o valor dos imóveis
- Aumento de Renda: Influência Positiva. Quanto mais as pessoas ganham, mais procuram imóveis e maior é a renda disponível para dar entrada e financiar (ou mesmo comprar a vista).
- Redução do Desemprego: Influencia Positiva. Mais pessoas trabalhando tem mais dinheiro e possibilidades de conseguir crédito.
- Inflação IPCA. Positiva³. A inflação é a perda de valor do dinheiro. Mas o imóvel é um bem real. Na verdade o preço do seu imóvel aumenta não porque ele está necessariamente valendo mais, mas porque o dinheiro é que está valendo menos.
- Inflação IGP-M. Positiva. O IGPM é o índice que reajusta os aluguéis. O alugueis são como os juros do imóvel. Quanto maior a remuneração do imóvel, maior o valor do ativo.
- Inflação INCC. Positiva. Mede o custo da construção civil. Se fica mais caro construir, esse custo é repassado ao consumidor.
- Taxa de juros imobiliário. Negativa. O aumento da taxa cria uma pressão negativa sobre os preços. Quanto maiores forem os juros, mais caras ficam as parcelas de empréstimo e portanto, menos acessíveis dados os limites % sobre a renda que os bancos geralmente exigem.
- Taxa de juros Selic. Negativa. A Selic remunera os títulos públicos e influencia os fundos DIs, CDBs e etc. Como explicado mais detalhadamente acima, a Selic é o custo de oportunidade de investimento em imóveis.
- Prazo para pagamento. Positiva. Quanto maior o prazo de pagamento, maior tende a ser a procura por imóveis já que as parcelas são reduzidas possibilitando que várias pessoas que não poderiam comprar antes, agora possam comprar.
- Oferta de crédito. Positiva. Quanto mais bancos tiverem verba para emprestar, mais pessoas terão acesso. No Brasil, o BB e a Caixa, bancos públicos aumentaram nos últimos anos de maneira bem agressiva os esforços pra concessão de crédito imobiliário.
- Demografia. Positiva. Quanto maior o crescimento demográfico da região, maior é a pressão sobre o preço dos imóveis. Mais gente nascendo ou migrando aumenta a necessidade de moradia e pressiona os preços. Lugares em que a população cresce rápido como o Rio tende a ter valorização de imóveis. Em lugares como Detroit em que cada vez tem menos gente morando, os preços caem. É a lei da oferta e da demanda.
- Obras de infraestrutura. Positiva. Tudo é precificado na região: construções de metrô, vlt, brt, saneamento básico, asfaltamento, viadutos, mergulhões, parques, bares, bons restaurantes, shoppings, padarias, boas escolas, etc …
- Violência. Negativa. Quanto maior a insegurança do local, menor seu preço
Enfim, muitos são os fatores que podem influenciar o valor dos imóveis. Houve um momento no Brasil em que os juros do financiamento habitacional caíram, a SELIC caiu, o prazo de financiamento aumentou, a oferta de crédito aumentou, o desemprego caiu, a renda do trabalhador aumentou… tudo parecia pressionar o valor dos imóveis para cima… é natural que tenhamos visto os preços subirem tão depressa.
A maior parte desses fatores, no entanto, tem esfriado ou até regredido nos últimos anos. Isso deve fazer os preços desacelerarem (o que já tem sido observado na maior parte do país).
Especialistas divergem quanto a existência de uma bolha no país. A resposta certa só o futuro dirá, mas acredito que este artigo possa ajudar a entender melhor, criar sua própria análise e enriquecer o debate sobre o assunto nas mesas de bar.
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A todos, um grande abraço!
PS.: Os valores do artigo são meramente ilustrativos. Eles servem para que o leitor possa mais facilmente entender a lógica dos números e seus efeitos.
¹ Na verdade, ao meu ver, a melhor comparação do retorno do aluguel é com a NTN-B. A comparação com a LFT visa apenas facilitar a compreensão.
² Novamente a ilustração busca facilitar a compreensão. O investidor pode optar por um título do tesouro em detrimento ao imóvel graças ao risco menor (risco de um inquilino não pagar ou atrasar o aluguel).
³ Em geral, considero a influencia positiva da inflação sobre o valor dos imóveis. Acredito que esta seja a relação principal. Isto não quer dizer que eu ignore o fato da inflação reduzir a renda disponível do investidor/consumidor, podendo pressionar o valor dos imóveis também para baixo, num caso mais extremo.