Trabalhei por alguns anos em uma multinacional alemã. Como especialista em Relações com Investidores, eu era responsável por fazer a ponte de report financeiro do Brasil para a Alemanha. Criei verdadeiros amigos germânicos.
Um desses amigos, num bate papo, me contava como a Alemanha se tornou a potência que é hoje. É claro que a história do catch up industrial alemão é antiga, mas algo nos anos 2000 tornou a Alemanha num dos maiores cases de sucesso dentre as grandes economias do mundo – sobretudo se mantendo de pé no pós crise de 2008.
Schröder – me disse ele – era um cara extremamente impopular na Alemanha. Em 2003, quando era chanceler, realizou uma profunda reforma trabalhista no país, flexibilizou as regras, possibilitou a redução da jornada de trabalho com redução proporcional nos salários e benefícios, retirou da lei diversas exigências e praticamente tudo poderia ser negociado entre sindicatos e empresários. Na época a resistência foi enorme. Com o passar do tempo, a Alemanha passou a crescer, a gerar empregos, e aos poucos, as pessoas começaram a entender o que houve ali… a história julga.
- Agenda 2010: “Vamos ter que reduzir os benefícios do Estado, incentivar a responsabilidade própria e exigir maior empenho de cada indivíduo” Gerhard Schröder, chanceler social democrata alemão, no Parlamento em 14 de março de 2003.
Em meio a um continente repleto de desempregados, a Alemanha é um ponto fora da curva. É verdade que por outro lado, a renda média caiu. Pudera, pessoas que antes não tinham emprego algum, hoje podem ganhar pouco, mas ganham. E tem emprego.
Mas não é só a Alemanha. É geral. Afinal, ninguém nunca parou para se perguntar por que os trabalhadores geralmente fogem justamente para países com menos regulação trabalhista?
Desafio: Qual grupo de países acima você acha que oferece aos seus trabalhadores leis trabalhistas mais “benéficas”?
Se viver em um país sem tantos direitos trabalhistas garantidos é tão ruim, por que milhares de mexicanos atravessariam desertos a pé para buscar a oportunidade de trabalhar em um país onde não há obrigação de aviso prévio, multa por rescisão de contrato e nem férias remuneradas – enquanto no México o custo médio de uma demissão é de 74 semanas de trabalho?
A Inglaterra, onde é muito fácil contratar e demitir e cada contrato de emprego é praticamente um acerto direto entre patrão e empregado com pouca regulação do Estado, recebe trabalhadores do mundo todo, em especial, espanhóis e portugueses, embora nos países deles seja muito difícil (praticamente impossível) ser demitido… só que (consequentemente) mais ainda ser contratado.
Não é que eu seja “contra interesses sociais”. Muito pelo contrário. Exatamente por me importar com famílias que não tem um ganha pão hoje no Brasil é que estou aqui a estas altas horas tentando mostrar que este “pseudo-interesse dos trabalhadores”, que muitos defendem, pode até ser bom de alguma forma (há controvérsias)… para os que mantêm seus postos, mas ao custo de um número alto de pessoas que são lançadas ao desemprego. E chutem quem são estes? Os mais improdutivos, em geral as classes menos abastadas.
Acredito que a maior dificuldade seja que as pessoas no Brasil enxergam o salário como uma espécie de mesada. “Hmmm… quanto que dá pra este cara sobreviver?”. Mas no mundo real, o mecanismo que define um salário é outro, bem fácil e lógico. Dá para todo mundo entender. Então, vamos lá.
Um empresário contrata um trabalhador que lhe gere renda. Claro, porque se lhe causar prejuízo ou ele deve demiti-lo ou se não o fizer e esta regra for geral, a empresa fecha as portas. Bem lógico, não?
Então, se um trabalhador é capaz de produzir o equivalente a R$ 3.000 ao mês de receita para uma empresa, o teto para o seu custo total terá que ser de R$ 3.000. Se for maior que isto, é prejuízo para o empregador que estará melhor sem este funcionário. Até aqui tudo bem, né?
Se 50% deste custo for referente a encargos, temos que seu salário poderá ser de no máximo R$ 1.500 reais. Imagina então, se o Presidente da Republica, interessado em aparecer como o pai do povo e angariar amores e votos, decide aumentar o salário mínimo do país para R$ 2.000. O que vai acontecer com meu amigo que produz o equivalente a R$ 3.000 ao mês? 2 opções: 1) Passa a trabalhar informalmente sem receber nenhum direito básico, sem contribuir nem mesmo para o INSS, ficando totalmente desamparado em termos de segurança social; ou, o que é pior; 2) Perde o emprego e talvez a única fonte de renda da família.
Quem perde com toda esta proteção ao emprego é sempre o trabalhador mais improdutivo, aquele que possui menos escolaridade, etc. Porque quando a régua do salário (ou dos benefícios) sobe, ele se afoga.
Tudo o que é exigido ao empregador é repassado ao trabalhador porque no final, o limite aos custos do trabalhador continua sendo sua produtividade – pois é no limite do que se planta, que se colhe, repito sempre por aqui.
Então, quando você aumenta os custos mínimos da contratação, você está jogando à informalidade ou ao desemprego todos aqueles que produzem o insuficiente para bancar estas exigências – retirando deles a chance de se formalizar e ter direitos básicos. Não é porque o empresário é mal não. É uma questão de pura lógica. Não existe almoço grátis. Salário não é mesada, é uma remuneração pela produção.
Você pode acabar com o 13º salário e o seu salário mensal aumentar 8,5% e vai dar no mesmo. O mesmo com as férias: elas podem deixar de ser remuneradas, mas seu salário mensal aumentar numa proporção em que no fim do ano você estará mesma situação financeira. Qual a diferença, afinal? Psicológica (e eleitoral).
Você acha mesmo que o seu 13º é um bônus? Não é. Ele está calculado como parte do seu custo – se não fosse obrigatório o pagamento de 13º salário, é justo imaginar que ele fosse incorporado ao seu salário mensal. No final, você ficaria na mesma situação, acredite!
Aliás, tanto o 13º quanto as férias, FGTS etc, são inclusive contabilizados com um custo mensal no Balanço da sua empresa. O que importa ao empregador é o seu custo, não o seu salário nominal.
O que rege a sua remuneração é o seu valor de mercado como profissional, baseado na sua capacidade de produzir. Se o que regesse sua remuneração fossem as leis trabalhistas apenas, todos no mundo ganhariam um salário mínimo e pronto. Não haveria bônus, plano de saúde, auxílio isto, aquilo… enfim… porque nada disto é obrigatório – mas é oferecido para atrair trabalhadores capazes de produzir. É a lei do mercado.
Pergunte aos milhares que trabalhavam na indústria paulista e foram demitidos este ano se eles não prefeririam flexibilizar suas jornadas de trabalho com igual redução de benefícios. Algo além de lay offs, e 1/3s… Aí você abre o jornal e vê uma notícia de um maluco que matou toda sua família e se suicidou porque perdeu o emprego.
Por que? Porque é difícil manter o emprego na dificuldade econômica do Brasil. O Governo apresenta um déficit enorme justificando que é incapaz de fechar as contas numa recessão, o empresário reduz os seus ganhos ou muitas vezes segura as pontas com prejuízos, mas um funcionário não pode ganhar menos. Então, acaba indo para a rua porque há quem ache melhor ele não ganhar nada.
O Brasil é mesmo um país curioso, onde um trabalhador com emprego formal CLT como eu é considerado “elite”. Num país em que mais da metade da população está fora do mercado formal, e portanto, sem acesso a nenhum destes benefícios que você diz defender, ter um emprego formal te torna elite. Então quando você diz defender “o interesse dos trabalhadores”, não é ao dos mais pobres que você se refere. A não ser que você viva no fantástico mundo de Marx… porque no Brasil real ter uma carteira assinada é sinônimo de sucesso entre os mais pobres. Tem algo muito errado nisso. É isso que precisa mudar.
No fim, reflitamos melhor… pois como diria meu amigo alemão, a história julga.
A todos, um grande abraço!