Eu sou contra o aborto. Não poderia ser diferente… Como filho bastardo de pai e de uma mãe divorciada com 2 filhas de outro casamento, eu seria um sério candidato a ser uma criança abortada.
Mas numa destas grandes ironias da vida, acabei nascendo e crescendo sob uma base familiar forte!
Lição 1: independente do cenário em que se dá a gravidez, há sempre uma chance das coisas mudarem… a vida é surpreendente!
Mas uma coisa é minha opinião pessoal. Ser contrário ao aborto não me faz contrário à sua legalização tanto quanto não ser homossexual não me impede de ser a favor do casamento gay.
A questão é que o tema é extremamente polêmico e inclui discussão científica e crenças religiosas… por isso, ao meu ver, cada família deve ser responsável por este julgamento. Na prática, isso já acontece… diversas mulheres que desejam abortar são submetidas a um risco enorme em clínicas clandestinas. Muitas morrem…
Não tem como saber ao certo o motivo específico que leva cada mulher a decidir abortar… mas pode-se imaginar que não seja só “por diversão”, certo? Aliás, deve ser suficientemente doloroso tomar esta decisão… o que torna razoável supor que na maior parte dos casos haja um motivo forte que apenas a gestante conhece bem.
Estes motivos que fazem as mulheres abortarem nunca deixaram (e nem deixarão) de existir apenas porque o aborto é proibido. Elas continuam fazendo e vão continuar quer seja legal ou não.
Então, a proibição do aborto me parece menos de fato uma defesa à vida já que quem quer abortar não vai deixar de fazê-lo só porque é ilegal. Por outro lado, o aborto sendo legal pode salvar as vidas das mães que hoje correm sérios riscos em clínicas clandestinas.
Lição 2: É possível que a legalização do aborto salve mais vidas do que tire.
O aborto e a redução da criminalidade em NYC
Stephen Dubner e Steven Levitt estudaram o efeito da diminuição da violência na cidade de NYC durante os anos 1990. Apesar dos políticos da época relacionarem a queda do índice de criminalidade com o aumento dos investimentos em segurança na cidade, Dubner e Levitt foram além. Eles analisaram minuciosamente o perfil dos criminosos na cidade de NYC – qual a idade média dos criminosos, qual era a situação familiar, o histórico, etc.
20 anos antes, durante os anos 70, no caso conhecido como Roe v. Wade a suprema corte americana decidiu que o Estado não poderia interferir na vida pessoal da mãe e que o dever do Estado é de proteger o cidadão, mas não o feto. Com esta decisão, o aborto foi legalizado nos EUA sob algumas restrições (3 primeiros meses de gestação etc).
O que Dubner e Levitt fizeram foi cruzar os dados do perfil criminoso nova iorquino com o perfil das famílias cuja mulher americana típica decide abortar. A conclusão foi que os perfis batiam e muitas destas crianças que foram abortadas nos EUA depois do caso Roe vs. Wade ao deixarem de nascer, deixaram de se tornar criminosos.
Os resultados da queda da violência em NYC começaram a aparecer em torno de 17 anos após o caso Roe vs. Wade, exatamente a idade média que historicamente os adolescentes entram para o mundo do crime.
Lição 3: Nascer em uma família pobre e que não deseja um filho não significa necessariamente que a criança se tornará um criminoso na fase adulta. Significa apenas que ela possui maiores chances de se tornar…
Mas não é apenas com base neste tipo de argumento que a posição contra ou pró legalização do aborto é tomada. Envolve uma série de convicções…
Pra ser honesto, não posso deixar de notar que me surpreendo com as posições das pessoas quanto ao tema. Amigos de direita que vivem defendendo a privacidade, a liberdade de escolha das famílias, neste caso são contra.
Os de esquerda são capazes de defender a vida dos assassinos mais bárbaros, nas situações mais peculiares… mas são radicalmente a favor da retirada de uma vida que nunca cometeu um crime sequer.
BTW, alguns argumentos me parecem até descabidos… tem gente defendendo a legalização do aborto no Brasil para o caso de estupro… mas, amigos advogados me corrijam se eu estiver errado… o aborto em caso de estupro já é legalizado no Brasil! Assim como o é no caso do risco de vida da mãe… certo?
Enfim, repito que sou contra o aborto apesar de a favor de sua legalização. A legalização não pode banalizar o ato. Não é normal abortar! É bom termos isto na cabeça… mas vamos reverter abortos através de campanhas, de educação… a proibição não serve.
No mais, numa semana triste como esta em que um avião cheio de jogadores, jornalistas, turistas e tripulação caiu interrompendo cada uma destas vidas de forma tão trágica… mais do que nunca devemos nos lembrar a cada segundo o valor que tem a vida.
E é com muita alegria que tenho a honra de dizer que minha esposa está grávida, esperando meu bebê há pouco mais de 3 meses. É um amor e uma alegria tão grande que muda nossa vida completamente mesmo antes de nascer…
Então, eu só posso pesar pelos que não tiveram a oportunidade de viver esta felicidade… nenhuma lei é necessária para punir o que a vida por si só já é tão dura.
Até!
PS.: A legalização do aborto é tb um tema econômico já que gera resultados estatísticos, influencia decisões etc. Dubner e Levitt são economistas renomados e premiados pelos seus estudos da Economia como ciência dos incentivos.
Reflexões coerentes com base sólida.
Sou contra o aborto, mas não é minha posição julgar quem se vê na necessidade de recorrer a ação tão comprometedora.
Parabéns, Papai!!!