Você sabia que um acionista de uma empresa pode alugar suas ações a outros investidores e, desta forma, receber uma renda extra por elas?
Veja como funciona o aluguel de ações
Detentores de ações que visam o investimento no longo prazo podem disponibilizar suas ações para empréstimos remunerados e os interessados podem as tomar emprestado mediante aporte de garantias e pagamento de uma remuneração ao proprietário.
Quem é quem neste mercado?
Como em português a palavra “alugar” serve tanto para o locador quanto para o locatário, convencionou-se chamar a operação de empréstimo e os envolvidos são chamados de doador e tomador.
Doador é o investidor que possui as ações e, como em geral não tem a intenção de se desfazer delas no curto prazo, as coloca para aluguel, recebendo assim, uma renda extra por elas.
Já o tomador precisa das ações para operar mas não deseja gastar todo o montante envolvido na compra direta de todas as ações que precisa. Ao invés disto, ele consegue as ações no momento em que deseja ao pagar apenas a taxa de aluguel a alguém que as possua. No final do contrato, ele deve devolver o montante de ações alugadas ao doador.
Todos saem ganhando.
Agora talvez você esteja se perguntando: mas para que o tomador precisa destas ações?
Imagina que você tenha convicção uma ação está sobrevalorizada ou que efeitos futuros farão com que a cotação desta ação cairá no futuro. O que você faria?
Bem, se você for proprietário desta ação, a primeira coisa é vende-las. Mas você não precisa parar por aí. Você pode tomar estas ações emprestadas de algum acionista que não tem a intenção de vende-las no curto prazo. No seu acerto com o proprietário destas ações, via contrato, você o assegura que devolverá as ações num prazo de, digamos 12 meses, e que você o pagará uma remuneração extra, a taxa de aluguel.
Uma vez que ele aceite sua oferta, você terá em mãos as ações em que você acredita que o valor vá cair. O próximo passo é vendê-las na Bolsa de Valores e com os recursos que você ganhar da venda, você poderá aplicar em renda fixa ou comprar outras ações.
No fim do contrato, é hora de devolver as ações que você tomou emprestado. Estando suas previsões corretas e o valor da ação caído, você recomprará estas ações por um valor mais baixo do que o recebido no momento de sua venda.
Segue um exemplo com números:
O investidor D é um cara que investe no longo prazo e não fica olhando o mercado no dia-a-dia. Já o Investidor T tem a convicção que uma superoferta de petróleo no mundo irá fazer o valor das ações da Petrobras despencar.
T toma 100 000 ações da Petrobras emprestada por 12 meses do Investidor D pagando-lhe 2%. Como as ações estão cotadas a R$ 10 cada, o tomador desembolsa R$ 20 mil para tomar emprestadas todas estas ações.
Uma vez em posse destas ações, o investidor T vende todas imediatamente no mercado, embolsando nada menos que R$ 1 milhão (cem mil ações vendidas a dez reais cada).
Logo em seguida, o investidor T aplica este R$ 1 milhão num fundo DI que irá render 10% líquidos (R$ 100 mil) no final de um ano.
Quando se aproxima ao fim do contrato, o valor das ações da Petrobrás caíram 20%, cotadas a R$ 8 cada. Para recomprá-las e devolvê-las ao proprietário delas (o doador), deverá desembolsar R$ 800 mil (cem mil ações compradas por oito reais cada).
Qual o lucro do investidor T (o tomador)?
- A diferença entre o que recebeu ao vender as ações (R$ 1 milhão) e o que teve que pagar para recomprá-las (R$ 800 mil) = 1 milhão – 800 mil = R$ 200 mil.
- Os juros recebidos pelo dinheiro aplicado no Fundo DI = R$ 100 mil
- Menos o custo da operação = – R$ 20 mil.
Ou seja, no total, o investidor T lucrou R$ 280 mil com a operação.
Qual o lucro do investidor D (o doador)?
Como a outra alternativa para o investidor D seria manter as ações paradas em carteira, o seu lucro foi o valor do aluguel de R$ 20 mil.
Neste exemplo, para simplificar, considerei que toda taxa de aluguel paga pelo tomador fosse embolsada integralmente pelo doador. No mundo real não é assim. Geralmente uma parte desta taxa, vai para pagamento de outras taxas e impostos além de remunerar a corretora de valores que intermediou a operação (spread).
É uma operação segura?
Para o doador, sim, uma vez que a CBLC atua como reguladora da operação e, junto à intermediação das Corretoras garantem os negócios.
Mas para o tomador, a operação consiste em alto risco. Imagine que no exemplo acima, as ações da Petrobras ao invés de caírem como o investidor imaginou, saltassem 50% (digamos que com as intenções de privatização da empresa) logo após serem vendidas pelo investidor T.
Neste caso, ele teria que gastar R$ 1,5 milhão para recomprar estas ações e devolvê-las ao doador. E sua operação daria um prejuízo de R$ 420 mil (+R$ 1 milhão – R$ 1,5 milhão – R$ 20 mil + R$ 100 mil).
Por não possuir as ações que irá vender, a operação que o tomador faz é chamada de “venda a descoberto” ou “short selling“. Se você tomar ações emprestadas e vendê-las estará portanto “shorteando” estas ações.
E se não der para recomprar as ações?
Em caso de falta de liquidez para a devolução do papel alugado é realizada a liquidação financeira, ou seja, o investidor recebe o valor em dinheiro de suas ações.
Tributação
Apesar de chamarmos a operação de “aluguel”, para o fisco trata-se de uma operação de renda fixa. Então, a remuneração ao invés de aluguel, é considerada “juros” (o que no fundo realmente é).
A tabela de imposto de renda para renda fixa é regressiva, como abaixo:
- Até 180 dias: 22,5%
- De 181 a 360 dias: 20%
- De 361 a 720 dias: 17,5%
- Acima de 720 dias: 15%
Na prática, os empréstimos são de curto prazo, raramente maiores que 6 meses.
É importante dizer que o imposto de renda é retido na fonte pela própria CBLC e os investidores não precisam se preocupar em recolher IR sobre estes ganhos.
Vale a pena?
Muito! Para o investidor pessoa física individual, principalmente como doador, possibilitando receber uma renda extra por seus investimentos de Longo Prazo.
É verdade que em muitas situações o vendido seja responsável por pressionar o mercado para baixo. Mas por outro lado, a operação tende a ajudar a todo o mercado já que o tomador, ao negociar com papéis que não possui, faz circular papéis que, de outra forma, estariam imobilizados na carteira do doador. A operação dá, portanto, liquidez e flexibilidade ao mercado tornando-o mais dinâmico e eficiente.
Além disso, como mostrado no primeiro exemplo deste artigo, é possível que os dois lados saiam lucrando se compararmos à situação em que estariam caso o negócio não fosse realizado.
Remuneração
Não existe uma taxa de remuneração padrão. Depende muito da ação e do momento. Em geral, pode variar entre 1% e 10% ao ano, mas neste mercado tudo é possível.
Custos Operacionais
Além da remuneração devida ao doador e a comissão da corretora, o tomador deve pagar ainda a taxa de registro da BM&FBOVESPA de 0,25% a.a. (mínimo de R$10).
A BM&FBOVESPA não cobra nada do doador, mas as corretoras podem cobrar suas taxas, dependendo da política de tarifação de cada instituição. Consulte sua corretora.
Outros pontos importantes
1. O doador pode solicitar a devolução das suas ações antes do vencimento do empréstimo apenas caso ele, o doador, tenha optado pela possibilidade de solicitar a devolução antecipada dos ativos antes do vencimento acordado no contrato. Neste caso, o tomador tem um prazo mínimo de três pregões para realizar a devolução ao doador a partir do momento em que ele solicite a devolução antes do vencimento do contrato.
2. O doador continua recebendo os proventos mas de forma indireta, sendo os mesmos cobrados do tomador pela BM&F e repassados ao doador. O doador no entanto perde a possibilidade de votar em Assembleias durante o período de empréstimo.
3. A BM&F limita o % de ações que estão emprestadas sobre o total de ações no mercado (free float). Hoje, o limite máximo para posições a descoberto é de 20% do total ações em circulação no mercado (free float). Existem limites também por investidor (3% do free float) e por corretora (6,5% do free float).
4. A BM&F divulga em seu site, o total de ações emprestadas por empresa, diariamente em seu site no link a seguir: http://www.bmfbovespa.com.br/pt_br/servicos/emprestimo-de-ativos/posicoes-em-aberto.htm
Conclusão
Você já deve ter ouvido falar naqueles investidores que lucram (muito!) em períodos de crise e a Bolsa toda vai mal, não?
Este é o caso típico dos “vendidos” (tomadores), que lucram em momentos de pessimismo e com a queda no preço dos ativos.
Espero ter tornado mais claro um assunto naturalmente já complexo.
A todos, um grande abraço!
Não adie mais, tempo é dinheiro!