Se você não tem coragem de cometer um crime, não significa que você é uma boa pessoa por não cometê-lo. Significa apenas que você tem medo de ser pego, de ser descoberto. E isso pode ser visto eu acho que em algum grau na violência das multidões, as pessoas se revoltam porque não acham que vão ser pegas e elas acham que receberam um certo voucher para fazer o que for porque não serão julgadas pelas demais, afinal ta todo mundo fazendo o que elas tbm estão. Ta todo mundo no mesmo barco. E ai a gente vê com frequência o tipo de comentario “mas fulano tbm fez” ou pior “todo mundo faz”.

E então eles cumprem a lei em circunstâncias normais, mas não por razões morais. Eles cumprem a lei porque têm medo de algum tipo de punição – seja de ser pego pela policia, pela justiça ou simplesmente de serem julgados socialmente pelo que fazem. Nietzsche foi muito cuidadoso em distinguir a mera obediência da moralidade. Duas coisas diferentes, embora possam passar despercebidas se a gente estiver olhando apenas para o resultado final. Pelo menos na maior parte dos casos.

Mas o que é muito importante nessa historia é que Nietzsche sempre pensava na obediência nem sempre como uma forma de covardia, porque também pode ser uma fonte de disciplina. E são duas coisas bem, bem diferentes.

Não cometer um crime porque você tem muito medo de fazê-lo, provavelmente é melhor do que cometer um crime, ao menos do ponto de vista social, a gente prefere estar cercado dessas pessoas do que das que teriam a coragem de fazê-lo de qualquer maneira… mas nada disso diz respeito necessariamento à moralidade. Pq do ponto de vista moral, além de mau, você ainda é covarde.

Então até agora eu trouxe aqui dois casos: 1) você comete o crime independente de qualquer coisa; 2) Não comete o crime por medo.

Mas existem alternativas. A mais obvia e que eu acho que eu realmente não preciso passar muito tempo aqui falando sobre ela é 3) quando você não comete o crime porque simplemente não tem vontade de cometê-lo, não é da sua natureza, e pronto. Muito simples. Mas tem um quarto ponto aqui, que é importante levantar que é o do auto-controle. Você pode ainda sim ser tentado a a fazer algo que você sabe que é errado, digamos, porque é da natureza humana de vez em quando querer romper com a moralidade, mas você tem o auto controle para dominar seus piores instintos. E a linha pode ser tênue e nem sempre clara de porque você não cometeu o crime, foi porque você se controlou e decidiu não o cometer ou por que vc simplesmente teve medo de ser pego?

E eu acho que apesar de as vezes ser dificil identificar claramente o que determina os nossos comportamentos, eu acho que na maior parte das vezes da sim. O resultado final é diferente porque quando o que te segura é o medo do que os outros podem te fazer, da punição externa, você se torna não confiavel quando acredita estar sozinho, sem ninguém para te ver ou te julgar ou punir.

Quando você se comporta de uma determinada maneira por uma decisão própria é diferente porque independente da situação em que você se encontra, agora você nunca está sozinho porque está sempre acompanhado de si próprio. O motivo que te impede é outro – e estará sempre presente. E isso é a moralidade, mais ligada a disciplina, a força e a coragem de enfrentar seu maior inimigo potencial: si proprio. Eh a coragem de se controlar e pôr em prática ser quem você decidiu ser independente do que o mundo externo possa pensar disso.

E isso independe de qualquer lei, né… porque as vezes têm regras que vão de encontro com a sua moral, com o que você acredita – como na Alemanha Nazista, por exemplo.

Mas ai também é importante entender quando o ganho coletivo é maior do que a vontade individual. As vezes a gente coopera, não necessariamente porque você esta de acordo ou porque têm medo, mas por uma questão digamos até democratica. Porque por outro lado, só cooperar com o que você concorda completamente é uma atitude bitolada e arrogante, diria até de alguém extremamente mimado e egoista. Aceitar o que não se concorda na maior parte das vezes faz parte da vida em sociedade.

E o motivo pelo qual eu to falando sobre tudo isso aqui hoje é que, além do assunto como sempre ser exaltar o auto-controle, é que faz agora mais ou menos um ano em que o Coronavirus mudou completamente as nossas vidas. Eh apenas um exemplo do que eu to falando aqui, mas é um exemplo coletivo no sentido em que todos nós fomos colocados à prova ao mesmo tempo. Um recorde de pessoas morrendo todos os dias, um virus com um poder de contaminação enorme… e que coloca em xeque a imagem que nos temos de nos mesmos. Hoje, é um momento diferente, em que ser “social”, ou seja, pensar na sociedade, requer ser “antisocial” no sentido de se aglomerar.

Eu hoje, aqui na região de Paris, entrei pela terceira vez em um ano em lockdown. Eh dificil? Sim… eu questiono a necessidade desse lockdown, meu momento especifico e os planos que eu tinha para este periodo. Além disso, à nossa vista, nossa dor sempre nos parece ser maior do que a dos outros.

Mas quando eu penso na quantidade de pessoas que perderam suas vidas, na dor que passaram sufocando numa UTI, com respiradores, isso os que conseguiram uma vaga na UTI… e penso na dor da familia dessas pessoas, nas que ainda vivem hoje mas que ainda vão passar por isso nas proximas semanas, ou meses… menos grave mas ainda assim doloroso, penso nas pessoas que perderam seus empregos, que perderam seus negocios, alguns que levaram a vida inteira para construi-los. Eh triste de tantas formas diferentes, da vontade de fazer algo para ajudar, mas o que? Para mim, respeitar o confinamento é uma forma. E olhando por esse lado, ficar em casa e adiar minha vida social não parece tão dramatico. Eu so posso me sentir na verdade privilegiado até então por ter uma familia para passar esse confinamento junto, poder trabalhar de casa. Nem todo mundo vive isso dessa forma, eu sei.

E por isso que eu não to aqui para julgar ninguém não porque eu acho que cada um sabe do que esta passando. Mas para dizer que cada um de nos está sendo julgado por si proprio. E esse é o julgamento mais poderoso, é a criação da imagem que a gente tem de nos mesmos. E desse julgamento ninguém escapa.

A todos, um grande abraço!

Riko Assumpção

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